Liberdade de Expressão

A redação do Artigo 12 tem o objetivo de garantir o devido processo na moderação de conteúdos por parte das plataformas, algo fundamental para o exercício da liberdade de expressão. O texto do PL 2630/20 diz que “os provedores de aplicação de internet submetidos a esta Lei devem garantir o direito de acesso à informação e à liberdade de expressão de seus usuários nos processos de elaboração e aplicação de seus termos de uso, disponibilizando mecanismos de recurso e devido processo” e que, em caso de moderação, “o usuário deve ser notificado sobre a fundamentação, o processo de análise e a aplicação da medida, assim como sobre os prazos e procedimentos para sua contestação”.

A proposição de devido processo se mostra necessária diante de inúmeros casos de abusos, por parte das plataformas, em suas ações de moderação. Hoje, o Marco Civil da Internet estabelece um regime de responsabilização das plataformas por conteúdos produzidos por terceiros que não as obriga nem as proíbe de removerem conteúdos – a única exceção é sobre a divulgação não autorizada de imagens íntimas, quando há obrigação das plataformas de indisponibilizarem tais conteúdos após solicitação da vítima ou de seu representante legal. Por esse regime, as empresas são apenas autorizadas a realizar moderações e remoções – algo que fazem com base em seus termos de uso. 

Inúmeros estudos, entretanto, mostram abusos nesses processos. Uma sistematização de dez casos de remoção de conteúdo pelo Facebook com maior repercussão em 2015, por exemplo, evidenciou a prática de censura privada com “fortes componentes discricionários e uma estética que pode ser apresentada como um tipo de biopolítica da sociedade informacional“. O levantamento ressaltou que “O Facebook não informa ao censurado o motivo específico  (…) informa apenas que o texto, imagem ou vídeo violou alguma regra da “Política de uso de dados” ou dos ‘Padrões da comunidade do Facebook’“. O Art.12 vem para sanar este tipo de problema, garantindo notificação com explicitação de motivos, direito à contestação por parte do usuário e reparação (não pecuniária) em caso de remoções que tragam danos aos usuários. 

Porém, no § 2º do artigo, o PL diz que “os provedores dispensarão a notificação aos usuários se verificarem risco: I – de dano imediato de difícil reparação; II – para a segurança da informação ou do usuário; III – de violação a direitos de crianças e adolescentes; IV – de crimes tipificados na Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989; V – de grave comprometimento da usabilidade, integridade ou estabilidade da aplicação”. A redação sobre essa dispensa de notificação tem gerado duas interpretação preocupantes: a primeira, de que, em outros casos, as plataformas não poderiam remover conteúdos antes de feita a contestação pelos usuários e concluído o processo de análise; a segunda, de que, para esses casos, haveria uma obrigação de remoção imediata por parte das plataformas. 

Para sanar tais questionamentos, a Coalizão Direitos na Rede sugere alterações na redação do artigo e considera que o melhor é remeter para o Código de Conduta, já previsto no PL, considerando a legislação nacional e os tratados internacionais ratificados pelo Brasil, as hipóteses de dispensa da notificação. Trata-se de alternativa mais apropriada para o debate sobre a dinâmica de moderação de conteúdo por parte das plataformas. Por um lado, o devido processo, que deve ser garantido, não fica engessado no texto da lei. Por outro, não resulta, involuntariamente, na ampliação de poder das plataformas sobre os conteúdos que podem circular ou não nas redes.

No mesmo artigo, é necessário suprimir o § 5º, que trata das deep fakes. A questão, alheia à sessão sobre garantia do exercício da liberdade de expressão dos usuários diante do poder das plataformas, também traz regramento para a indisponibilização de conteúdos com base em termos extremamente vagos, como “indução a erro” e “manipulação para imitar a realidade”. A Coalizão Direitos na Rede entende que o problema das chamadas “deep fakes” também deve ser tratado pelo código de conduta.

Por fim, o § 6º do Art.12 deve ser transformado em artigo específico, para garantir, também em defesa da liberdade de expressão dos usuários, que o direito de resposta previsto neste ponto seja objeto de decisão judicial e tenha garantida a proporcionalidade em seu alcance.